Domingo, 4 de Novembro de 2012
Solenidade de todos os santos
— O Senhor esteja convosco. — Ele está no meio de nós.
— PROCLAMAÇÃO do Evangelho de Jesus Cristo, + segundo Mateus.
— Glória a vós, Senhor.
Naquele tempo, 1vendo Jesus as multidões, subiu ao monte e sentou-se. Os discípulos aproximaram-se, 2e Jesus começou a ensiná-los:
3“Bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o Reino dos Céus.
4Bem-aventurados os aflitos, porque serão consolados.
5Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a terra.
6Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados.
7Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia.
8Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus.
9Bem-aventurados os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus.
10Bem-aventurados os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino dos Céus!
11Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem, e, mentindo, disserem todo tipo de mal contra vós, por causa de mim. 12aAlegrai-vos e exultai, porque será grande a vossa recompensa nos céus”.
Comentário
O chamado “Sermão da Montanha” faz parte
do discurso inaugural do ministério público de Jesus que se estende
entre os capítulos 5 a 7 do Evangelho de São Mateus. Hoje, vamos
observar o primeiro dos cinco discursos que o evangelista distribui
estrategicamente no seu livro.
No texto destacamos dois elementos
fundamentais: primeiro está o lugar de onde Jesus fala e o conteúdo do
discurso. Depois de pregar nas sinagogas da Galileia – acompanhado de
uma grande multidão -, Jesus sobe ao monte para rezar, escolhe os doze
apóstolos e depois chega a um lugar plano. Ali, Ele se senta. Os Seus
discípulos e toda a multidão se aproximam d’Ele. Então, tomando a
palavra, Jesus começa a ensinar: “Bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o Reino dos céus…”
A intenção evidente do evangelista é
apresentar-nos um discurso completo. Há portanto, aqui, uma unidade
retórica, sendo este termo entendido não só como uso de figuras de
estilo mas, sobretudo, como forma de usar as palavras e construir o
discurso visando cumprir um determinado objetivo que, neste caso, é
proclamar o Evangelho do Reino de um modo novo.
Não há aqui espaço para uma interpretação
detalhada do texto. Utilizaremos como marco hermenêutico a novidade que
este sermão nos traz, advertindo desde já que, de maneira nenhuma,
trata-se de ruptura com o Antigo Testamento, mas sim do seu pleno
cumprimento em Jesus Cristo. De fato, Ele declara: “Não penseis que vim revogar a Lei ou os profetas. Não vim revogá-los, mas levá-los à perfeição”. Levar à perfeição é o mesmo que “dar pleno cumprimento”, realizar plenamente.
À semelhança de Moisés, que sobe ao Monte
Sinai para receber as tábuas da Lei que há de comunicar ao povo de
Israel (cf. Ex 19,3.20; 24,15), há quem veja na pessoa de Jesus um “novo
Moisés” que surge como Mestre, não apenas de Israel, mas de todos os
homens chamados à vocação universal de serem discípulos de Cristo pela
escuta e vivência da Sua Palavra: “Nem todo o que me diz: ‘Senhor, Senhor’ entrará no Reino do Céu, mas sim aquele que faz a vontade de meu Pai que está no Céu” (Mt 7,24). Ou ainda: “Todo
aquele que escuta estas minhas palavras e as põe em prática é como o
homem prudente que edificou a sua casa sobre a rocha”. Jesus
senta-se na “cátedra” de Moisés (a montanha) como o Moisés maior, que
estende a aliança a todos os povos. Assim, podemos ver o Sermão da
Montanha como “a nova Torá trazida por Jesus”.
Devemos insistir, porém, que não se trata
aqui de abandonar a Torá dada na aliança do Sinai. É sabido que o
primeiro Evangelho foi escrito para uma comunidade de cristãos de origem
judaica, enraizados e familiarizados com a Lei de Moisés, que
continuava a ser valorizada e praticada. A preocupação do evangelista é
mostrar que, sem abolir nada do que Moisés tinha deixado, Cristo – com a
Sua ação – o supera e leva à perfeição como só Ele pode fazer,
absolutamente melhor do que qualquer outro profeta.
O que Mateus nos apresenta, no texto de
hoje, não tenho nem sequer uma sombra de dúvida de que seja o anúncio de
um novo céu e uma nova terra onde haveremos de morar. É como que a
realização de todas as promessas e bênçãos de Deus nos discípulos da
Nova Aliança em Cristo, assim como no novo espírito com que se deve
cumprir a Lei, concretizado nas práticas da esmola, da oração e do
jejum.
A atitude dos filhos do Reino se traduz
numa nova relação com as riquezas, com o próprio corpo e as coisas do
mundo e com Deus, a quem nos dirigimos como Pai e de cujo Reino se busca
a justiça antes de tudo. Como não se pode dizer que se ama a Deus se
não se ama os irmãos, não falta aqui a referência a uma nova relação com
o próximo. Finalmente, o epílogo do Sermão faz uma recapitulação e um
apelo veemente a não apenas escutar a Palavra, mas a pô-la em prática de
forma consciente e deliberada.
Procuramos, da forma mais breve possível, ver como em Jesus Cristo se cumpre a promessa de Deus ao povo de Israel em Dt 18,15: “O Senhor, teu Deus, suscitará no meio de vós, dentre os teus irmãos, um profeta como eu; a ele deves escutar” e a Moisés em Dt 18,18: “Suscitar-lhes-ei
um profeta como tu, dentre os seus irmãos; porei as minhas palavras na
sua boca e ele lhes dirá tudo o que Eu lhe ordenar”. Como acontece noutras passagens dos Evangelhos, também aqui Jesus Cristo anuncia o Reino dos Céus.
Esta é uma forma semítica de dizer “Reino
de Deus”, que está no meio de nós e se realiza plenamente no domínio ou
reinado de Deus sobre todas as Suas criaturas e na aceitação ativa,
alegre e jubilosa desse reinado pelas mesmas criaturas, a começar pelo
homem, criado à Sua imagem e semelhança.
O Sermão da Montanha é então, para nós,
um autêntico programa de vida cristã que não deixaremos de meditar e pôr
em prática todos os dias, pois ele compreende o “anúncio de um novo céu
e uma nova terra onde haveremos de morar.
Padre Bantu Mendonça